quinta-feira, 17 de novembro de 2011

Que fazer?

Eis a fúria taxonômica de nossa era.
E eu toda pronome indefinido.
Adiante, o muro pixado por nós: os nomes.
De tão antigos tijolos forjado,
Ligado por nossos suores do tempo,
Serve agora com todo intento
A tolir nossas vozes mais sinceras.

Com os pulsos de pronome indefinido,
Desmesurada, soco o velho muro.
Pois prefiro as minhas incertezas em carne viva
A contemplar o silêncio óbvio que me corroi as ideias

sábado, 30 de julho de 2011

E fim

Sangrava muito
Mas em gotas
Lágrimas de pulso
O grande conta-vidas
De verdade, assim:

vida n° 1: que ela era uma criança quieta
- Mãe, você tem certeza que eu não tô sonhando? Não quero acordar e ter que fazer tudo de novo...
- Para de bobagem, menina! Vai agir a vida!
[mas ela não sabia o que era "agir a vida", só bobagens de sonho]

vida n°2: que ela era estranha aos treze
- Cara, olha essa luz! Não parece que somos mais humanos por sermos efêmeros?
- Para de usar essas palavras estranhas, você parece louca!
[mas ela se gostava louca, e só]

vida n° 3: que a loucura ficou sexy aos 17
- Olha o que eu escrevi:

Neste mundo eternamente desencontrado
Eis a árdua tarefa: pertencer-se
Perdi-me de mim diversas vezes
E, inocente, procuro-me em outro
Se a perda si é necessária ao amor
Espero sinceramente encontrar-me em ti
Neste mundo eternamente desencontrado

- Você é linda - E a beijou
[mas ela não acreditou. Só sabia de encontros em poemas.]

vida n° 4: que ela quase chegou a acreditar aos 18
- Cara, é estranho, quando penso "será que te amo" me parece uma estranha certeza...
- Para com isso, menina, esses seus textos estranhos são mentiras. Palavras são mentiras. O que existe é o encontro e só.
[mas pra ela eram desencontros, o que a fazia sustentar sempre aquele olhar melancólico]

vida n° 5: que ela viu aos 20
- É um monólogo agora, sabe? Na verdade sempre foi. Tentei me completar na poesia, não deu. Vou arrebentar minha carne pra tocar a vida.

E sangrava muito
Mas em gotas
Lágrimas de pulso
O grande conta-vidas
De verdade, assim
E fim

sábado, 2 de julho de 2011

Batom vermelho

[Nem houve tempo pra saudade, não é mesmo? Você mandou tantas mensagens... - Mas pra ela houvera, sempre houvera o tempo da saudade - E pra falar a verdade não há mais motivo, não é mesmo? As nossas ideias nem se encontram. Não vejo por que vir te ver. Eu não venho mais, tá? - Tá. - Mas, como sempre, ela chorou e disse que o amava e que tinha que soltá-lo e mais uns inúteis clichês. E agora? Agora isso, ué! A vida, os amigos velhos, os novos, os falsos, os de copo... Uma noite de muitas cervejas e no fim aquela música - ai, como ela passara a odiar Los Hermanos! - , aquela maldita música que ela não tinha pra quem cantar - mas cantou. E sorriu. E ah, todos achavam tão sexy todo aquele melodrama - mas pra ela era verdade. E ela sorria tanto que chegou a acreditar em si. Além do mais, ela era daquelas que nunca olham pra trás - e não olhou. Não diante deles.]

segunda-feira, 27 de junho de 2011

Noite

Ligava-se,
Ninguém atendia.
Insone,
De luzes acesas ferida.

Os músculos
Tesos de estranho saber
da vida
E doía

Adormecia.
Pingo a pingo,
Provava a morte
Conta-vidas
E fim.

sábado, 21 de maio de 2011

Diário

As partes minhas que arranco -
Peles e unhas
Expõem
A carne viva dolorida,
Aflita
Que trago dentro...
Embora permaneça
Com os olhos brandos
Contendo apenas uma faísca
Escapulida, à toa
Numa distração.
Certas coisas demoram a mudar...

terça-feira, 17 de maio de 2011

Posso?

Só pra eu dizer que te vi,
Que te toquei,
Nos limites que o infinito outro pode ser tocado,
Com licença.
Me invento pra você caso queira
E isto não é qualquer coisa...
Sim, é pro meu prazer,
Você me permite?

É que dentre tantos Prometeus [neste mundo de gaiolas]
Com as vísceras expostas e ainda assim
inertes...
Seus olhos e boca e mãos e movimentos
Espalham
Uma deliciosa liberadade,
Vibrante
Plena.
Posso?

quarta-feira, 11 de maio de 2011

Pós

 Não mais conceito
Não mais consenso

[o humano] Só
                  De si e do outro
                  Só

Um parafuso:
a apertar
Só.
Por ele, o humano:


Sem futuro.
História com fim.

Sem poema: pedra e Sol.

quinta-feira, 7 de abril de 2011

Meio

Ínterim de mundo
Lugar comum
Dois cigarros,
Nenhuma aspiração.
Existo.

Parte minha, parte!
Embora de lugar algum
parte.
Permanece minha
parte.
E parte...

D' A Última Ceia
O Senhor
Estaca de mim mesmo
E só, sempre só...

Condição de escrita:
separação.
Espalho pela vida
fragmentos de auto-abandono

domingo, 3 de abril de 2011

Ela, ele e eu

Invade-me o marasmo de um sábado qualquer
No teto, o ventilador gira - uma só vez,
Giro fictício, só a minha mente girou.
Que será que houve?
Eu queria respostas - e não havia.

Sim, estou a esquecer seu rosto,
Sempre assim.
Na verdade nunca o capturei de todo,
Sempre assim - por quê?

Escorrego
Pelas cadeiras e mesas da casa...
"Onde será que deixei...
O que mesmo?"

Ah, já sei!
A poesia, ela é que me falta.
Minha eterna amante,
Senti-la: eis do que preciso...

Imprecisa... em que papéis...
Em que fragmentos de cartas
Perdi-a? Sempre esquiva...
Onde escapara a infame?

Se enlouqueço?
Claro - humana que sou

Deixo-me em esquinas quaisquer.
Em sábados quaisquer...
Até que ela volte pra mim.

Mas você... ainda bem que você está sempre aqui.

sexta-feira, 1 de abril de 2011

Isso, mais nada

Hoje não quero perder nenhum ônibus.
E não quero a embriaguez dos teus beijos,
Se eles calarem as vozes
Que eu tanto demorei a soltar
E sufocavam-me as ideias.

Quero um abraço que me liberte,
os meus lençóis com aquele cheirinho bom...

Hoje não quero tocar-te a alma.
Quero o beijo dos lírios
Nos meus olhos cansados de ser.

Não quero sorrisos de lado
Que me tonteiam até ficar sem rumo.

Não hoje, não mais.

Eu sei o que quero - por incrível que pareça.

Hoje quero a doçura
Que sei exatamente onde encontrar.

segunda-feira, 7 de março de 2011

Hoje

Aspiro este ar quente e sujo do Rio de Janeiro
Como quem sorve uma amarga cerveja.
E é bom, mas às vezes
Faz os olhos arderem e choro.

E isto é o meu tocar no mundo
É o estar junto
Dele; toda, minha, meu.

E quanto ao senso, que se perdeu;
Volta aos poucos, lento, todo,
Quando piso o duro asfalto.

Logo, logo,
Vai ser hora de ir pro mar...

quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

Nós

Ainda chove.
Férteis ficaram as ideias e a varanda.
Passadas as torrentes, chegou a garoa
Claros são os rastros de violência
Mas nos canteiros brotam débeis os verdes brotos.
Inacreditável é ainda sua sobrevivência,
Mas eles, irreverentes, cismam em brilhar infantis
Sob nuvens de chumbo.

Vestindo um sorriso pálido que lhe colore a face,
A poeira dos brilhantes que lhe ostentavam os olhos,
Ela, doce como sempre,
Parada na porta, observa a infância: sua e das folhas.
E, como elas, insiste em sorrir sob as nuvens de chumbo.

Só dez minutos...

Minha alma sempre nua,
E a tua,
Só panos.
Lembro-te doce, mas sempre longe
As bocas que não se encontram...
Uma só ligação, muitos enganos.

A cafeína impede o sono
O corpo esquenta
Será verão ou saudade?
Os olhos secos de motivos
E vermelhos de vontade

Será que você ainda sabe?

Eu lia pra você dormir.