sábado, 30 de julho de 2011

E fim

Sangrava muito
Mas em gotas
Lágrimas de pulso
O grande conta-vidas
De verdade, assim:

vida n° 1: que ela era uma criança quieta
- Mãe, você tem certeza que eu não tô sonhando? Não quero acordar e ter que fazer tudo de novo...
- Para de bobagem, menina! Vai agir a vida!
[mas ela não sabia o que era "agir a vida", só bobagens de sonho]

vida n°2: que ela era estranha aos treze
- Cara, olha essa luz! Não parece que somos mais humanos por sermos efêmeros?
- Para de usar essas palavras estranhas, você parece louca!
[mas ela se gostava louca, e só]

vida n° 3: que a loucura ficou sexy aos 17
- Olha o que eu escrevi:

Neste mundo eternamente desencontrado
Eis a árdua tarefa: pertencer-se
Perdi-me de mim diversas vezes
E, inocente, procuro-me em outro
Se a perda si é necessária ao amor
Espero sinceramente encontrar-me em ti
Neste mundo eternamente desencontrado

- Você é linda - E a beijou
[mas ela não acreditou. Só sabia de encontros em poemas.]

vida n° 4: que ela quase chegou a acreditar aos 18
- Cara, é estranho, quando penso "será que te amo" me parece uma estranha certeza...
- Para com isso, menina, esses seus textos estranhos são mentiras. Palavras são mentiras. O que existe é o encontro e só.
[mas pra ela eram desencontros, o que a fazia sustentar sempre aquele olhar melancólico]

vida n° 5: que ela viu aos 20
- É um monólogo agora, sabe? Na verdade sempre foi. Tentei me completar na poesia, não deu. Vou arrebentar minha carne pra tocar a vida.

E sangrava muito
Mas em gotas
Lágrimas de pulso
O grande conta-vidas
De verdade, assim
E fim

sábado, 2 de julho de 2011

Batom vermelho

[Nem houve tempo pra saudade, não é mesmo? Você mandou tantas mensagens... - Mas pra ela houvera, sempre houvera o tempo da saudade - E pra falar a verdade não há mais motivo, não é mesmo? As nossas ideias nem se encontram. Não vejo por que vir te ver. Eu não venho mais, tá? - Tá. - Mas, como sempre, ela chorou e disse que o amava e que tinha que soltá-lo e mais uns inúteis clichês. E agora? Agora isso, ué! A vida, os amigos velhos, os novos, os falsos, os de copo... Uma noite de muitas cervejas e no fim aquela música - ai, como ela passara a odiar Los Hermanos! - , aquela maldita música que ela não tinha pra quem cantar - mas cantou. E sorriu. E ah, todos achavam tão sexy todo aquele melodrama - mas pra ela era verdade. E ela sorria tanto que chegou a acreditar em si. Além do mais, ela era daquelas que nunca olham pra trás - e não olhou. Não diante deles.]